Dica de Destaque

Noiva abandonada - Divagando Sempre

 * Nota de agradecimento no final




Estella tinha tudo para ser a mulher mais feliz e realizada do mundo. Tinha dois melhores amigos, Samuel e Amanda, tinha o trabalho perfeito e, estava prestes a se casar. 

Ela conhecia Samuel desde o ensino médio, mas não falavam sobre o fato dele ser gay, então ela não perguntava pensando que era difícil para ele sair do armário. Antes de se conhecerem e se tornarem melhores amigos, ela o tinha visto abraçado à outro garoto, pareciam bem íntimos e quando ela o conheceu, ele nunca falou nada sobre ser gay e ela decidiu não perguntar. Mesmo porque, ela achava que pelas atitudes dele, ele talvez não quisesse que ninguém soubesse. E por anos ele não namorou ninguém, o que reforçava sua ideia sobre a preferência sexual do amigo ser secreta. Ela achava que quando chegasse a hora, ele lhe contaria. 

Mas aí ela conheceu Amanda e se tornaram um trio inseparável. Até que Amanda engravidou e casou, nessa ordem mesmo. Amanda era oriental, descendente de japonês, sua gravidez foi um escândalo, ainda mais aos 20 anos. Mas Gabriel era tudo de bom para ela. Juntos, eram perfeitos.  E Gabriel acabou lhe apresentando Henrique, por quem se apaixonou. Ele era meio parecido com Sam, os dois eram loiros, olhos azuis, embora Sam fosse mais alto e magro, Henrique era mais encorpado, tinham várias coisas em comum e principalmente,  ele era hétero.  

Mas, como tudo na vida, nada é perfeito ou definido, pois Estella acabou sendo abandonada no dia do casamento. Já estava tudo pago pelo noivo, seu vestido estava no seu quarto pronto para ser usado, seus votos já estava impresso em sua mente de tanto que ensaiou, mas tudo pareceu se desfazer quando Henrique lhe disse:

_ Desculpe Estella, não é você, sou eu. Sinto muito mesmo cancelar em cima da hora, mas não posso me casar com você. 

Simples assim. Sem mais explicações, Henrique apenas deixou Estella e sumiu do mapa. 

Quando ela acordou naquela manhã, poderia ter desconfiado de seu triste destino quando ao abrir a janela, ver o céu desabando em água. E recebendo a notícia do abandono de Henrique por telefone, tão covarde que nem teve coragem de lhe dizer pessoalmente. 

Mas corajosa como era, reuniu seus dois melhores amigos, que ela sabia que eles entenderiam o que ela estava prestes a fazer. Assim que chegaram, ela os informou que eles teriam uma grande aventura pela frente. Ela vestiu seu vestido de noiva e declarou aos amigos, que seria um desperdício não usá-lo e também que doariam toda a comida e bebida da festa, já que estava tudo pago. 

Apesar de em cima da hora, não estranhou que a família de Henrique não ficasse surpresa com o cancelamento do casamento, mas ainda assim, tentou avisar todos os convidados possíveis. 

Quando ela conseguiu ir até a igreja, a chuva já tinha diminuído e os enfeites já estavam sendo retirados. Partiu seu coração que seu sonho não se realizaria. O padre se aproximou correndo achando que teria casamento, já que Estella estava vestida de noiva. Mas ficou triste quando ela confirmou que não, que o noivo havia cancelado. Não tinha motivos para ela ter vergonha do padre, quantas noivas eram abandonadas não é mesmo?

Ele então a abençoou e ela perguntou um local onde poderia doar a comida do casamento. Ele logo se animou, doações eram sempre bem vindas, não importava de que forma era. Ele indicou um local e Estella se dirigiu para lá com os amigos. 

Não se importou com os olhares de admiração ou de pena quando a viam vestida de noiva ou quando descobriam que tinha sido abandonada. Um senhorzinho lhe pegou a mão e carinhosamente lhe disse que Deus havia lhe tirado a pessoa errada e colocaria a certa em seu caminho. Ela quis chorar, mas segurou porque não era hora para sentir pena de si mesma. Tanto desabrigado sem família e sem comida, ser abandonada era o de menos. 

Os doces da festa ela levou para um orfanato e mais uma vez sentiu vontade de chorar, vendo todas aquelas crianças sem lar, se divertindo e sujando os rostinhos com chocolate. Não eram muitos doces, porque no casamento não haveria muitas crianças, mas foi o suficiente para aquelas que dariam trabalho depois para as cuidadoras do orfanato com tanto açúcar no sangue. Ela deixou o bolo do casamento também, que era de três andares, deixando o menor para ela claro, pois ela também adorava doces. 

As bebidas foram para um bar, onde o dono era um conhecido seu e lá, ela bebeu até sentir que suas pernas não a sustentavam mais. Amanda achou que ela fosse chorar, mas Estella apenas dançou até ficar descabelada e seu vestido sujo nas barras. Alguém ali achou que era uma despedida de solteira mas Estella disse que era uma despedida de quase casada. Sam achou que ela fosse chorar, mas mais uma vez ela foi forte. Mas ele sentiu que era hora de levar a noiva para casa. 

Amanda queria ficar com a amiga e mesmo Gabriel dizendo para ela cuidar de Estella, ela queria voltar para casa também, pois tinha ficado o dia todo fora e sabia que Gabriel se sentia culpado por Henrique ser seu amigo, mas como ela sentiu que Sam podia fazer isso, cuidar da amiga, ela decidiu ir embora. Mesmo porque, sabia como Sam amava Estella.

Achando que Estella dormia largada no sofá, Amanda perguntou se tudo bem para ele ficar ali. Quando ele confirmou, ela não aguentou e perguntou. 

_ Você a ama né? 

_ Claro que amo, assim como amo você,  seu filho e seu marido. 

_ Eu sei, mas eu falo de outro jeito. 

Ele tinha entendido claro, mas não queria explicar por causa de um mau entendido que até agora ele não conseguia desfazer. Suspirou ao dizer:

_ Sim, eu sei, mas ela acha que sou gay.

_ O que? Mas por que? 

_ Também não sei, mas não consegui contar à verdade e depois ela conheceu o Henrique e estava toda apaixonada e eu tinha perdido minha chance de explicar. 

Amanda o abraçou e o deixou cuidando da amiga. Porém, Estella havia escutado tudo e se sentiu tremendamente idiota por ter tirado conclusões precipitadas. Achava que Sam não tinha saído do armário, por isso não ficava com ninguém. Para início de conversa, se eram melhores amigos, ela deveria ter questionado primeiro sua sexualidade antes de pensar coisas só por tê-lo visto abraçado com outro cara. 

Se sentia envergonhada e não queria mais se levantar até Amanda voltar, mas ela estava apertada e entre enfrentar Sam ou fazer xixi no vestido, ela preferia a primeira opção, então se mexeu e tentou se levantar. 

Ele veio para seu lado na hora e perguntou se ela precisava de algo. Ela só disse xixi e ele a levou para o banheiro. Então se lembrou de todas as vezes em que ele estava no quarto com ela e ela ao trocar de roupa na frente dele, ele sempre dava um jeito de desviar os olhos para outra coisa para não vê-la nua. 

Ele a deixou na porta e foi para a sala. Ela fez seu xixi e decidiu tomar um banho. Mas não conseguia abrir o vestido. Foi até a sala e pediu para ele ajudá-la. Quando ele tocou sua pele, ela sentiu uma faísca, mas achou que era por causa da bebida e por estar carente. 

Tomou seu banho e ao sair, enrolada na toalha, sentou na privada e começou a chorar. Dessa vez ela deixou tudo sair e seus soluços devem ter chamado a atenção de Sam, que veio com roupas confortáveis para ela. Lhe ajudou a vestir, tendo o cuidado de não olhar para o corpo nu dela, secou seu cabelo, deu bolo para ela, que comeu com gosto e deitaram juntos no sofá. Ele perguntou se ela queria ver algum filme, mas ela fez que não. Estar aninhada nos braços dele como tantas outras vezes, era reconfortante, embora dessa vez, sentisse algo diferente. 

Ela dormiu quase instantaneamente no calor do corpo de Sam,  mas acordou logo cedo e se moveu entre o corpo dele, ela percebeu como ele a desejava. Mas não queria lhe contar que gostava dele desde o ensino médio mas que depois  achou que ele fosse gay, como dizer agora o motivo sem parecer boba?

Sam acordou e ficou visivelmente consciente do seu desejo e com vergonha disse que precisava ir ao banheiro. Por sorte Amanda chegou e Sam foi embora. 

Estella abraçou a amiga e lhe contou que escutou tudo na noite passada e confessou que amava o amigo desde o ensino médio, mas que um dia o tinha visto abraçado com outro garoto e por isso achou que ele fosse gay.  Amanda não resistiu e chorou de tanto rir das trapalhadas da amiga. 

_ Jesus Estella, porque nunca me contou isso? Eu poderia ter esclarecido isso a muito tempo. 

Estella encarou a amiga com os olhos esbugalhados. 

_ Como assim? Ele não parecia gay pra você?

_ Não. Eu sempre soube que ele tinha uma quedinha por você. Não entendia porque você não ficava com ele, agora tá explicado. 

_ Mas e ele abraçado com o garoto?

_ Porque não pergunta para ele? 

_ O que? Agora? 

_ Não, mas quando ele voltar a noite. Porque ele vai voltar, mesmo tendo receios ou medo, ele sempre vai voltar pra você. 

Estella estava ansiosa, nem pensava mais em Henrique e na dor de ser abandonada, ela pensava naquele garoto tímido que cresceram juntos e no entanto, a quem não conhecia de verdade. 

Amanda via a ansiedade da amiga e secretamente havia enviado uma mensagem enigmática para Sam dizendo apenas: é hoje. Venha lindo e cheiroso. 

Quando a campainha tocou, Amanda foi atender toda alegrinha e deu um abraço no amigo e sussurrou no ouvido dele: cuida bem dela. 

Estella ainda estava no quarto quando ouviu a campainha. Ela se demorou escolhendo o que usar, parecia até que iria sair para um encontro. Quando foi para a sala, a danada da Amanda tinha ido embora sem se despedir. 

Sam estava no sofá, quantas vezes ele ficou ali em outras eras, pois era o que parecia,  que isso tinha sido anos atrás e não poucos dias antes do casamento. Ele também parecia sem jeito. 

Ela foi até ele como sempre, lhe abraçou e deu um beijo no rosto. Pequenos gestos de sempre agora pareciam ter outro significado. Seu coração parecia querer saltar do seu peito. Então ele perguntou como ela estava. Quantas vezes ela escutou essa voz e no entanto, agora, a fazia se sentir nas nuvens. 

Ela respondeu que bem e ficaram em um silêncio constrangedor. Então ela respirou fundo e fez a pergunta que ele esperou todos esses anos. 

_ Sam, você é gay?

Foi assim, simples, curta e direta. Ele a olhou com um certo alívio e o sorriso mais lindo que ela já tinha visto naquele rosto. 

_ Não. 

As misturas de sentimentos no rosto de Estella foram de alívio e vergonha. Principalmente quando ele perguntou:

_ Por que você acha isso? 

Ela ficou vermelha no rosto e no pescoço. Tinha vontade de se esconder. Não tinha coragem de olhar para ele, mas ainda assim respondeu:

_ Quando estávamos no ensino médio, antes de nos conhecermos, eu te vi abraçado com um garoto. Vocês pareciam bem íntimos. 

Ele pensou e então com tristeza disse:

_ Ah! Você está falando do meu irmão. Ele tinha câncer, não tinha muito tempo, mas aquele dia ele se sentia bem então queria ver o por do sol daquele ponto onde dava para ver a escola. Ele não pôde ir normalmente e desejou que eu vivesse dias felizes,  cheios de aventuras e conhecesse alguém especial. Ele morreu dias depois e então te conheci. Mas estranhamente você achava que eu era gay e não consegui dizer que não era e depois o tempo passou e fiquei com medo de perder sua amizade. 

Estella riu apesar do momento triste. 

_ Sinto muito pelo seu irmão. Você nunca me falou dele. 

_ Já era difícil ser o amigo gay, não queria que ficasse com mais pena de mim. 

_ Desculpe ter tirado conclusões precipitadas. Por isso achava estranho eu sentir atração por você mesmo você ser gay. O que agora está explicado que não é.

_ Desculpe não ter contado antes. 

_ Por isso você nunca namorou ninguém e fugia dos encontros que eu marcava para você. 

_ Eu sempre te amei e se fosse para ficar com você como amiga, para mim era o suficiente. Mas espera, você sentia atração por mim?

_ Bom, ainda sinto, acho que só ia me casar com o Henrique porque não podia ficar com você. 

_ Sabia que ele era meio parecido comigo? 

_ Eu sei. 

Se abraçaram e se beijaram pela primeira vez. E foi bem diferente para Estella, ela sentia como se estivesse flutuando e só existisse os dois no mundo. Não houve casamento mas ela viajou com Sam na lua de mel já que tinha sido paga pelo Henrique. Que ficou totalmente falido depois de ter fugido. 



* Se você chegou até aqui, tenho esperanças que tenha gostado nem que seja um pouquinho desse conto. É a primeira vez que escrevo e posto ao público, então pode ser que esteja bem cru ainda. Esse conto foi inspirado em um sonho que tive, trabalhei e melhorei alguns detalhes, mas baseado em sonhos, a gente sabe que pode ser meio fora da realidade hahaha 

Quando eu sonhei, foi bem mais fragmentado e intenso, principalmente quando Estella descobre o desejo de Sam por ela hahaha 

Bom, as vezes precisamos arriscar para ver no que vai dar né. Humildemente agradeço se chegou até aqui. Sua atenção é muito importante  para mim. Obrigada de coração. 

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